sábado, 14 de fevereiro de 2009

In Memorian

Tudo o que queria era entender como a vida funcionava. Gostaria de saber por que foi tão dura com ele. Poderia ter acreditado mais em si mesmo. Não conseguiu. Nos seus últimos anos, procurou na religião sua paz interior. Não encontrou. Queria que sentissem orgulho dele, e não pena. Sua auto-piedade já lhe fazia mal o suficiente.

Gostaria de ter dado mais conforto à mulher e às filhas. Queria ter comemorado o primeiro aniversário de Larissa. Sempre teve, desde a infância, um olhar perdido e triste. Nunca conseguiu perdê-lo. Podia ter pedalado mais. Não teve tempo. As dores não deixaram. O tumor cresceu e corroeu suas entranhas, seus sonhos, sua vida.

Não pôde usufruir sua bike nova, que havia acabado de ganhar. Nunca mais pedalaremos juntos. Não me ajudará mais nas coisas que combinamos alguns meses antes. Trabalhos incompletos. Projetos deixados pela metade.

Não sabemos se pagaremos a conta de luz amanhã, se usaremos aquele tênis novo que compramos ontem. E aquele texto que não terminei de escrever? E a conversa com os amigos na semana vem? Não sabemos nada. É difícil para mim lidar com perdas assim. Quando é alguém com seus 90, 95 anos, é mais natural e aceitável. Mas, morrer aos 36, numa luta desigual contra si mesmo, no momento em que sua sorte parecia mudar para melhor, é uma grande sacanagem. No mínimo, injusto.

Hoje, faz oito meses que ele se foi. Assim é a vida. Às vezes, pagamos caro pelos nossos erros, nossos medos, nossas escolhas. A lição que fica é o velho clichê: viver a vida como se não houvesse amanhã, sem deixar nada pra depois. Tá bom, sempre ficarão pendências, obras inacabadas (até Beethoven deixou a sua). Porém, devemos tentar. Sempre. Até o fim.

Em memória ao amigo Ademir. Que, finalmente, tenha encontrado a paz.

2 comentários:

Marcos Forte disse...

Caramba João. Que puta homenagem.

Parabéns pelas palavras.

Marcão.

Alexandre Ofélio disse...

Genial. Sem palavras

Texto curto e direto. Sem tempo para pensar em nada. Um soco na vida!!! É ler e acordar...Isso mesmo João, vamos viver intensamente.

Mandou bem!!!

Montanha