sexta-feira, 30 de janeiro de 2009

AINDA OS CHAMAMOS PELO PRIMEIRO NOME


É incrível como após tantos anos, da derrocada do idealismo panfletário dos anos 60, passando pelo ceticismo dos 70, até o marasmo musical desta década e da incontestável contribuição musical, ainda hoje os chamamos pelo primeiro nome. Na história da música pop, nenhuma outra banda conseguiu uma proximidade tão grande e intensa com seus fãs quanto eles.

Após a morte de George, fui tomado por um sentimento de nostalgia sem precedentes. Foi como se tivesse perdido um primo distante e, a ferida que já estava cicatrizada desde o trágico assassinato de John começou a sangrar novamente. Então, a lembrança de passagens de minha infância e adolescência tornou-se mais viva. E o gosto por suas canções também.

Sempre que possível, mantenho-me informado sobre suas vidas. Ringo grava muito pouco e vive tranquilo em sua fazenda. Fiquei triste quando Linda, a esposa de Paul, faleceu de câncer há algum tempo. Felizmente, o velho Macca não só se recuperou do baque, como gravou uma sequencia de álbuns fantásticos, onde resgatou sua veia rock and roll. Quanto a George, o pior se confirmou em 29/11/2001. Era o mais místico dos quatro. Soube de sua morte dois dias depois, indo para o trabalho. Imediatamente meus olhos encheram-se d’água. Estava na companhia de minha esposa e minha filha. Então, segurei as lágrimas.

Acho que a paixão pelos Fab Four começou já na fecundação. Estávamos na década de 60, no auge de seu sucesso (inclusive aqui no Brasil) e a atmosfera daquela época estava impregnada por suas músicas – ainda bem, pois a partir daí os anos seriam de chumbo. Digo isto, porque minha mãe sempre conta a historia de que, já aos quatro anos de idade, toda vez que os ouvia, pulava e cantava como um louco, tentando balançar o cabelo como eles (em vão, claro). Lembro-me que vivia cantando Obla-Di Obla-Da pelos cantos, sem ter ideia do que significava (até hoje não tenho). Algum tempo depois, um de meus irmãos chegou em casa com toda a coleção deles. Todos os discos! E mais algumas coletâneas! Lá estavam, em minhas mãos, todas as canções da maior banda de todos os tempos! No inicio, comecei ouvindo as mais conhecidas: I Wanna Hold Your Hand, Help, Get Back. Aos poucos, passei a devorar todos aqueles discos de forma voraz. Mesmo durante a adolescência, no auge de meu gosto por rock pesado, nunca deixei de ouvi-los. Mesmo que, em alguns momentos, com menos frequência.

Nos períodos em que estiveram totalmente fora de moda (e da mídia), sempre encontrei malucos com o mesmo gosto “ultrapassado”. Discutíamos nossas preferências por canções, álbuns, sobre quem cantava melhor, ou quem era o mais legal. Sempre tive uma preferência especial por Paul e suas composições – que alguns críticos chamavam de canções de amor tolas. Ringo compunha pouquíssimo. Mas, sua importância para a unidade da banda é inquestionável. George, além de ser o responsável pela introdução de instrumentos indianos, que deu um toque mais místico à música do grupo, escreveu grandes canções como While My Guitar Gently Wheeps. Seu ponto alto foi no disco Abbey Road, onde compôs os dois maiores hits, mais duas excelentes músicas. John era a cabeça, o mais consciente, o mais político. É dele a primeira canção da banda que fugia dos temas românticos (Help). Também, as mais experimentais e maior conteúdo psicodélico.

Em um contexto geral, os maiores hits da carreira do grupo foram compostos por Paul. Porém, não é este o motivo de minha preferência. Ele criava desde as mais belas e singelas canções de amor (Yesterday e Eleonor Rigby, por exemplo), passando por baladas contagiantes (Hey Jude, Oh! Darling), rocks furiosos (Helter Skelter). Mesmo quando recriava clássicos de outros artistas, conseguia performances melhores que os originais (Long Tall Sally, de Little Richards, é o melhor exemplo). Considero-o um dos cinco melhores cantores de rock de todos os tempos. É dele a primeira canção do pop internacional que tenho consciência de ter curtido em seu tempo. Tinha uns sete ou oito anos e a música era “Band On The Run”. Além de tudo isso, minha admiração por ele multiplicou-se ainda mais após o lendário show que fez no estádio do Morumbi, em 1993. Os “mega-astros” Madonna e Michael Jackson, haviam acabado de passar por aqui, com aquelas exigências absurdas, muita frescura e um certo ar de desdém por qualquer coisa abaixo da linha do Equador. Alguns dias depois, chega Paul McCartiney, um dos melhores cantores e compositores de todas as épocas, ex-membro e fundador da maior banda (de rock, pop e afins) da história, com uma simplicidade e simpatia impressionantes. O cara tem uma importância para a música muito maior do que as outras figuras citadas, e mesmo assim, não precisou se esconder de ninguém, nem usar máscaras ou desprezar os fãs. Foi realmente uma grande lição de humildade e respeito.

Quanto aos álbuns, enquanto a maioria considera Sgt. Peppers insuperável, eu sempre achei o Álbum Branco, tanto pela versatilidade, quanto pela sua qualidade e despretensão, o melhor disco da banda. Mesmo com a deterioração das relações entre eles – as gravações transcorreram em um clima péssimo, chegando a ponto de quase não se falarem no estúdio -, o resultado final é genial. Depois dele vem o maravilhoso Abbey Road; Revolver – o verdadeiro divisor de águas da carreira do grupo; o revolucionário Sgt. Peppers; e Help, o melhor disco da primeira fase.

Pois é. Só agora, na casa dos 40, é que sinto com mais intensidade a importância da influência que eles exerceram e ainda exercem sobre mim. A paixão pela música e a musicalidade inerente. Considero-me um privilegiado por ter crescido com eles. Thank you guys!

domingo, 25 de janeiro de 2009

Soul Music

Sem saudosismos, nos últimos meses tenho ouvido muita música dos anos 60. Especialmente a soul music. O nome não podia ser mais apropriado: musica da alma. Essa é a sensação que sinto quando ouço aquelas canções. Elas tocam bem lá no fundo, na alma da gente. A primeira vez que tive contato com elas foi nos anos 80, através do filme “Os Irmãos Cara de Pau (The Blues Brothers)”, que tinha uma trilha sonora absolutamente espetacular. Fui atrás, pesquisei e descobri que eram clássicos do blues e soul, sem distinguir o que era um e o que era o outro. Nasceu aí, meu caso de amor pelos dois.

Alguns anos depois, outro filme veio sedimentar essa paixão: “The Commitments” (que teve um subtítulo nacional imbecil – “Loucos Pela Fama”). Era a história de jovens irlandeses pobres que, por pura paixão e em pleno início dos anos 90, resolvem montar uma banda e aventurar-se pelo gênero. Comprei o disco e comecei a me interessar pelos originais. Lembro-me de uma frase que o protagonista dizia: “os irlandeses são os negros da Europa”. Não me lembro bem o porquê. Deve ser pelo fato de serem discriminados pelos primos ricos do continente – guardadas as suas devidas proporções.

A este altura, já estava completamente hipnotizado pela atmosfera soul. Conheci a Motown, gravadora fundada em, 1959, em Detroit, por um visionário chamado Berry Gordy Jr. Ele conseguiu captar o novo som que era feito pelos negros nos EUA, uma época em que o rock de Chuck Berry e Elvis começava a dar sinais de cansaço. O som da Motown tinha algumas características marcantes: seus arranjos continham harmonias recheadas de instrumentos de corda e muita influencia da música gospel. Outra gravadora importante foi a Stax, fundada em 1957 por Jimmy Stewart, em Memphis. Sua sonoridade era bem diferente. Tinha um som mais cru e denso, com uma pegada mais blues e rock.

Nem todos os grandes artistas Soul são da Motown ou Stax. Porém, todos tiveram uma importância capital para a evolução da música dos anos 60 e das décadas seguintes (negra ou não). Basta dizer que artistas dos mais diversos gêneros como os Beatles, os Stones, Prince, os Chilli Peppers e, mais recentemente, Joss Stone e Amy Winehouse, beberam de suas águas. Nos anos 70 e, em menor número nas décadas seguintes, mais clássicos foram paridos sob a alcunha do soul. Houve, ainda, a evolução para uma música mais dançante, o funk - o original, não o lixo carioca de hoje. Porém, as maiores pérolas foram criadas na década de 1960.

Você conhece a música soul? Se não, experimente. Se até um velho rocker de coração duro como eu foi sensibilizado por ela, todos podem. Experimentem. O legado deixado por James Brown, Marvin Gaye, Ray Charles, Stevie Wonder, Aretha Franklin, Smokey Robinson, entre inúmeros outros nomes, será lembrado para sempre como uma fonte inesgotável de inspiração para qualquer época.

quinta-feira, 15 de janeiro de 2009

Reflexões em movimento


Antes do texto, o contexto. O ano era 2004. Estava desempregado, em crise no casamento, meu cachorro havia morrido e o futuro parecia reservar poucas perspectivas. Alguns de vocês sabem que sou ciclista nas horas vagas. Pedalar não faz bem só para o meu corpo. É um momento de reciclagem, de reflexões. E, em uma dessas, idealizei e escrevi...


REFLEXÕES EM MOVIMENTO

Em movimento
Tudo fica mais propício.
A ansiedade dá uma trégua.
A angústia cessa temporariamente seu ataque.
Golpes no fígado
Que vão minando a resistência.
Fica-se menos vulnerável a pensamentos tolos
Sobre coisas improváveis,
Mas não impossíveis.
Transformar o fogo que queima
Em combustível para a alma
É encontrar a paz
Sem sair da luta.
É continuar girando
E olhando para frente.
Sem culpa, sem salvação.
De frente para a encruzilhada
Com uma nova aurora pintada de azul
E uma tonelada saindo dos ombros
Recolho meus estilhaços pela manhã
E vou me recompondo aos poucos
Deixando pedaços de mim pelo asfalto:
Suor, saliva, ressentimentos.
Aspirando cada partícula de fuligem
E transformando em energia bruta.
Com ela, me sinto um super-homem
Nas ruas da megalópole.

sexta-feira, 9 de janeiro de 2009

O que fará Obama?

Primeiro texto de 2009. Um ano que já começou em guerra. Em todos os noticiários, o assunto é a brutal invasão de Israel à Faixa de Gaza. Não se justifica o uso de tamanha força a um inimigo com um poder bélico tão desproporcionalmente inferior. Não quero discutir quem são os verdadeiros donos daquele duro e árido pedaço de terra. Se Deus ou Alá. Muito menos quem atirou primeiro.

O atual presidente americano já manifestou seu apoio total e irrestrito ao exército israelense, como já se esperava. Já sabíamos, também, que a desacreditada ONU, em um gesto tucano, ficaria em cima do muro.

Até agora, Obama pouco falou. Está cauteloso. O que fará ele com este primeiro abacaxi internacional que terá de descascar? Será tudo aquilo que se espera dele? Ou, ele é apenas a outra face da mesma e desgastada moeda? Seria Barack Obama apenas um produto de marketing criado para limpar a barra yankee, completamente suja após oito anos de trapalhadas cometidas por Bush Jr?

Talvez não. Ele parece consciente do peso que carrega. O peso de milhões de acorrentados em navios fétidos vindos do continente negro. O peso do lamento blues nas plantações de algodão do sul dos EUA. O peso dos excluídos do sonho americano. Ele sabe que nunca alguém de sua cor chegou tão alto.

O que se espera dele é que acabe com esta guerra estúpida, que cancele o embargo econômico à Cuba, que corte os gastos do orçamento bélico americano, que comprometa-se em acabar com o genocídio de fome e AIDS na África de seus ancestrais, que assine o protocolo de Kyoto. Ele sabe que se fizer tudo isso pode provocar a ira dos ultraconservadores e acabar com uma bala na cabeça.

Talvez Obama não tenha a coragem e competência necessárias para promover tais mudanças. Ele não é o salvador da humanidade, como tentam mostrá-lo. Não se pode cair nesta armadilha. Mas, aparentemente, é mais inteligente, maleável e tolerante que seu antecessor – o que não é muito difícil. Pode ser o início de uma era com menos armas e mais diálogo. O que já seria um grande avanço.